O compasso e as sirenas

Sexta-feira, 16/11/12. Sono e preguica pra levantar naquela manha. Os dias cada vez mais curtos e o sol nascendo timido na velha Jerusalem. O dia prometia passar ligeiro, mas precisei trabalhar. Tinha que atender um pedido da minha gerente. Afinal as ultimas semanas trabalhamos 24 x 7, atendendo grupos e agentes, brasileiros pra la e  pra ca, que iam e viam pela cidade santa.

Nos jornais, novidade so  as eleicoes americanas e o terrivel Sandy. No Brasil, as eleicoes para prefeito e governador. Sao Paulo conquistada por Hadad.. Na Europa, a malfadada politica de reducao ao salario.   Por aqui os conflitos de sempre, o sul vivendo as constantes ameacas e misseis que alteram sua rotina ha 12 anos. Bibi, se preparando para as suas previas.

Ja me preparava para passar mais um shabat em Jerusalem, e ainda queria comprar frango, quem sabe cozinhar alguma coisa, ja que passaria sozinha. De repente recebo uma chamada internacional, era um agente brasileiro pedindo pra que eu convencesse o lider do grupo a viajar naquela epoca pra Israel, pois a midia tinha apavorado a pobre senhora de Minas Gerais.

Tentei me inteirar o maximo que pude sobre a crise. Mas como convencer alguem do que eh obvio? Afinal nao eh todo dia que o Exercito Israelense aniquila um dos lideres mais perigosos da facao terrorista Hamas que assola com violencia e terror o sul de Israel. Pegaram o Jabari em cheio. Foi uma incisao cirurgica, explodiram o temido lider terrorista em pedacinhos. Portanto, ai viria retaliacao. E vimos a guerra e a ameaca de guerra pela Internet, pelas redes sociais, facebook e twitter. Ameacas e mais ameacas dos dois lados.

E agora? Como desfazer a resolucao de alguem de nao querer viajar para a tao sonhada terra santa, por medo de guerra? Mas nao houve tempo pra isso, de repente, soube pelos jornais que 2 misseis atingiram Tel Aviv. Ja nao podia pegar no telefone e dizer: "nao se preocupe minha senhora, acalme-se". Afinal estava la estampado em todos os jornais do mundo. Era como um dejavu. Eu novamente naquela situacao de misseis e indicio de guerra. Cheguei no pais e literalmente fui recebida por uma saraivada de misseis, em abril passado, na cidade de Ashdod, ao sul de Israel. Por 6 meses, vivi as experiencias de abrigo anti-bombas estado de alerta, madrugadas despertada pelas sirenas, estar sempre pronta para o alerta vermelho.

Mas dessa vez parecia ser diferente, parecia mais eficiente, mais real, mas amedrontador, afinal os misseis chegaram ate Tel Aviv. So faltava alcancar a capital, Jerusalem. Dito e feito!  

Para meu alivio os brasileiros adiaram a viagem para outra data. Menos mal, assim nao teria que convencer alguem e dar garantias estatais, de seguranca nacional. Logo eu, uma simples imigrante recem-chegada no pais. Ja era 4h da tarde, o tempo consumido pelas manobras ao telefone, alteracoes, cancelamentos, avisos de ultima hora, enfim nao havia mais onibus pra voltar pra Jerusalem. Faltavam apenas alguns minutos para entrar shabbat.

Tomei um taxi e no caminho ia conversando com o motorista, um israelense que viveu pelos menos 2 das grandes guerras que o pais enfrentou e decidiu  convercer-me que o unico caminho que os vizinhos de Gaza conhecem eh pela violencia! Foi uma aula de 30 minutos sobre historia de Israel e de suas guerras e conquistas pra manter seu territorio. Cheguei em casa e  uma estranha sensacao de nao querer estar so, me tomou a alma. Fui finalmente tomada por um sentimento indescritivel de "pertencer", "de fazer parte". Houve ali no meio daquela conversa, algo que despertou o meu DNA espiritual conectado, enraizado com o meu  povo, a historia, a terra, a nacao. Israel me pertence e eu pertenco a Israel. Assim foi como senti.

Um sentimento sobrenatural de amor, de apego, de desespero, de nao quer largar, nao querer desistir. Tudo isso tomou conta de mim. Em questao de segundos, decidi fechar a porta de casa e seguir ate a kehilat mais proxima onde sabia que poderia encontrar abrigo, ouvir a parasha, orar por Israel.  Segui direto pra la.

Acho que Papai do Ceu ja tinha preparado esse dia em minha vida, sabia que se estivesse so, naquele momento talvez pudesse ser pior. Afinal as 5 da tarde, ouvimos pela primeira vez em anos, o som agudo e apavorante da sirena por toda a capital. Pronto! Em algum lugar de Jerusalem cairia um daqueles misseis. Em algum lugar de Jerusalem poderia haver vitimas. Oramos, nos recolhemos todos em paz, tranquilos ao abrigo e como bunkers humanos oravamos e cantavamos ate que tudo se acalmasse. Uma estranha sensacao tomou conta de mim, por um lado tristeza por saber que chegaramos a mais um ponto crucial de nossas vidas. Viviamos a sindrome da pequena nacao suicida ao toque de homens bombas. Mas uma nacao que nao se rende, antes luta e com todas as forcas. Entao, de tristeza, migrei para a alegria de pertencer a isso tudo. Algo que parece insano em um primeiro olhar, da tristeza (depressao), a alegria (euforia).  Assim eh Israel e sua historia.

Dias depois, outro sinal de alerta vermelho e mais uma vez a sirena toca em  toda a Jerusalem. Os misseis nao sao mais de pequeno alcance, como muitos querem ainda acreditar. Sao poderosas armas de guerra cada vez mais modernas e com capacidade de destruicao e morte fora do comum.  Mais tarde, antes do acordo de cessar-fogo, outro ataque terrorista e dessa vez de bomba dentro de um onibus em Tel Aviv. Quantas vezes tomei o 66 qdo estudava ali. Nesse dia, passei horas com minha mae ao telefone tentando acalma-la.

 Sigo aqui vivendo entre o compasso de espera, de um cessar-fogo dubio e enfraquecido, sem poder de encerrar o conflito de vez, e as sirenas que tocam em minha alma para sempre. Esperando sempre por dias melhores e desejando com todo o amor fazer parte dessa terra, de Israel em minha alma e em meu coracao.

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